18.1.09

tiques de grande cidade II

Há muito que oiço um amigo dizer, em tom de piada, que quando acorda de manhã sente logo a mão do Estado – a expressão fiel é “a mão do Sócrates” – a entrar-lhe no bolso das calças para lhe sacar dinheiro. Esta imagem explica mais que uma grande dissertação sobre os tentáculos do Estado (leia-se as formas que o Governo inventa para extrair dinheiro aos contribuintes).
Com as devidas proporções, a nível local, as coisas passam-se sensivelmente da mesma maneira. Hoje vão ser os parquímetros, amanhã será outra coisa qualquer. O Executivo (Camarário) não resiste à tentação das receitas extraordinárias.

Mais que desnecessária, a ideia dos parquímetros em Espinho é descabida. É, desde logo, inoportuna. A nossa cidade está notoriamente sem vida a diversos níveis, e as pessoas são permeáveis a isso e não vêm. Espinho é hoje incapaz de envolver os seus habitantes e ainda menos capaz de chamar pessoas de fora. O que é premente é adoptar medidas que aproximem as pessoas da cidade e não que as afaste. Ter que pagar 0,80€/hora para ir tomar um café à beira-mar ou para fazer compras no centro da cidade está longe de ser chamativo. Se a ideia é que Espinho continue a ser uma cidade-fantasma, então estamos no bom caminho.
Para além disso, não é prioritária. Dir-me-ão que as prioridades são relativas. E que quando se trata de onerar a população com mais uma taxa, a relatividade passa a urgência num abrir e fechar de olhos: é ver os parquímetros medrar nos passeios como flores na Primavera. Mas não há obras para concluir, que afectam – e de que maneira! – o trânsito em Espinho? Sim, a rotunda. Sim, a conclusão do enterramento da linha.
Mais: que alternativas vão ser colocadas à disposição dos cidadãos? Zero. Não faz sentido que colocar parquímetros nas ruas da cidade seja a solução primeira para, supostamente, “regulamentar o trânsito na cidade”. Parece-me evidente que fazer recair sobre a população este encargo devia ser a ultima ratio, sobretudo quando a opção é colocar a moeda no parquímetro ou... colocar a moeda no parquímetro.
Quanto à manifesta falta de critério na determinação da taxa a cobrar por uma hora de estacionamento nem vale a pena falar. Ao menos sejam sérios e façam o favor de explicar aos espinhenses que do que se trata é de taxar o estacionamento como forma de obter determinados ganhos.

Não há nada mais triste para uma pequena cidade como a nossa do que esta constatação: estamos destinados a decisores cheios de iniciativas, prontinhos a ditar sentenças que ninguém pediu, baseadas em necessidades que ninguém sente, sempre com o lucro como pano de fundo.
aa

5 comentários:

Nuno Nasoni disse...

Aproveito para um desabafo. Moro em Espinho e trabalho no Porto. Tenho a minha filha mais velha num colégio de Arcozelo (ao qual se juntará brevemente a mais nova).
Em várias ocasiões, o meu percurso matinal consiste em levar a mais velha ao colégio de carro, vou ao apeadeiro da Aguda, estaciono e apanho o comboio para o Porto. Quando não levo a miúda ao colégio, vou de carro para a estação de Espinho (poupando um trajecto de pouco mais de 15 min. a pé - mas muito inconveniente com chuva), estaciono e apanho o comboio.
Frequentemente, vou de comboio para Lisboa (onde, por vezes, pernoito). Neste caso, tenho duas alternativas. Vou no pendular das 8h, deixando o carro em Espinho (e nesses dias costumo ir demasiado carregado para ir a pé para a estação), ou vou no pendular das 6h52, o qual tenho de apanhar em Gaia (deixando o carro no parque da estação).
Qual a consequência dos parcómetros? Como não há alternativa de estacionamento junto à estação, o uso do carro fica inviabilizado. O que significa que passo a ter de apanhar sempre o comboio na Aguda quando quero ir para o Porto e sempre em Gaia quando quero ir a Lisboa.
Perante este cenário, a que até sejunta a comparativa degradação da qualidade de vida em Espinho, o resultado óbvio é que acabarei por mudar de casa, passando a viver na região Aguda/Miramar (diga-se que já tenho a casa à venda).
Tenho muita pena, porque gosto muito de Espinho e de morar na cidade. Mas, manifestamente, a sua "evolução" não tem sido propriamente no sentido de oferecer qualidade de vida.

cidade aos quadradinhos disse...

A Ana tocou na ferida. A adopção de parquímetros é uma solução inadequada e inoportuna, que apenas servirá para espartilhar ainda mais os comerciantes e para afastar as pessoas do centro da cidade, mesmo aquelas que, como o nosso leitor Nuno, nele habitam. O caso do Nuno, infelizmente, não é único e Espinho tem perdido milhares de habitantes às custas de políticas urbanas desadequadas, da falta de emprego e da especulação imobiliária. Veremos qual será a factura a pagar no futuro, por 15 anos de incúria.

Anónimo disse...

espinho é cada vez mais uma cidade fantasma, e muito se deve a este tipo de medidas. As obras (que eram necessarias) do enterro da linha afastou muita gente, logo a solução seria apresentar novas medidas para atrair pessoas à cidade que é cheia de recursos, mas que ninguem na câmara tem capacidade para ver isso, optando por lançar os paqruimetros, de forma a que os espinhenses paguem pelos "turistas" (para não chamar rechinchas) que deixarão de visitar Espinho (se é que ainda há alguma coisa a visitar sem ser... o mar!)

juju disse...

A taxa é claramente exagerada, mas os espinhenses são demasiado cómodos. Quando é que numa cidade tão pequena é necessário carro? Caminhar que faz bem :)

cidade aos quadradinhos disse...

Olá Ju!
É verdade - vai-se bem a pé para qualquer lado em Espinho. Para quem vive em Espinho; já não será assim para quem vive nos concelhos limítrofes. Ou para quem tenha que trabalhar no centro da cidade e viva longe.

Mas a questão nem é essa. É basicamente não haver alternativas. Não haver critérios, sobretudo na determinação da taxa. Alguém conhece um sítio em todo o país onde a preço por hora seja comparável?!
Eu não.

Mas estou contigo, e contra mim falo, caminhar faz bem. Já que os parquímetros são um dado adquirido, que ao menos sirva para pôr as pessoas a zelar pela saúde. :) Há que ver o lado positivo da coisa!
aa